As empresas Vale, ArcelorMittal e Samarco Mineração, investigadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Pó Preto da Assembleia Legislativa, devem ser obrigadas, por meio de ações civis públicas, a compensar e reparar, imediatamente, os danos ambientais e coletivos que geram à população capixaba.
Esta é uma das 23 recomendações do relatório aprovado por unanimidade nesta quarta-feira (7) pelos deputados que integram a comissão. Além das poluidoras, o documento define atribuições do Estado, da própria Assembleia, e de órgãos da Justiça.
A CPI chama à responsabilidade, para que seja consolidada essa exigência, os órgãos de fiscalização – Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Seama) e Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) -, Ministérios Públicos Estadual (MPES) e Federal (MPF), e Defensoria Pública. As empresas devem indenizar os moradores e estabelecimentos das regiões impactadas, por despesas contínuas com a limpeza do pó preto e pintura de prédios, além dos gastos com tratamento de saúde.
Essa compensação, no entanto, “não passa apenas pela questão financeira, mas com ações efetivas e solucionadoras dos problemas que afligem a população do Estado”.
O resultado da investigação afirma que, comprovadamente, a Vale, Arcelor e Samarcoviolam o direito da coletividade a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, respectivamente na Grande Vitória e em Anchieta, sul do Estado. Não só as próprias empresas reconheceram que respondem pela poluição atmosférica durante os trabalhos da CPI, como as manifestações técnicas e documentação reunida pela comissão, diz o documento.
“Esse passivo ambiental, indubitavelmente de responsabilidade dessas empresas, precisa ser cobrado”, afirma o relatório. A comissão concluiu que “nessas regiões, a população vive uma epidemia de doenças respiratórias e cardíacas, enormemente agravadas devido ao alto grau de poluição do ar”.
A gravidade da situação e a extensa lista de doenças e problemas relacionada à inalação e exposição às partículas poluentes, reveladas pelos depoimentos médicos ouvidos na CPI, foram consideradas “estarrecedoras” pelos deputados.
“Não resta dúvida de que a exposição da população capixaba a gravíssimas partículas poluidoras dispersas na atmosfera e no solo é um fato público, notório e que precisa ser urgentemente solucionado”. O relatório defende que a poluição do ar seja tratada como um problema de saúde pública.
Os deputados criticam no documento os argumentos de que as empresas operam no Estado em acordo com a legislação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). Para eles, além de inconsistentes, esses argumentos “representam verdadeira autorização para matar”. E ainda que “não se pode conceber que pessoas sofram, com gravíssimas consequências à saúde”.
Acusando o poder público de negligência frente ao aumento da poluição, o relatório ressalta que não há nenhuma justificativa, seja ela de ordem econômica ou técnica, que isente os órgãos de fiscalização ambiental de suas ações ao longo de todos esses anos. Nem se considera aceitável, atualmente, com a forte mobilização popular na luta contra a poluição do ar, respostas como “meras proposições e discursos sem resultado efetivo”.
O documento ressalta que “não se pode tolerar que empresas como a ArcelorMittalTubarão S/A, Vale S/A e Samarco S/A não busquem permanentemente processos mais eficientes e limpos em relação às suas atividades, mormente quando se sabe que já dominam tais tecnologias, inclusive aplicando-as em plantas espalhadas em outros países”.
Na ausência dos órgãos que têm competência para acionar as empresas judicialmente, a Assembleia Legislativa se propõe a fazer, por meio da Comissão de Meio Ambiente, presidida pelo deputado Rafael Favato (PEN), que também presidiu os trabalhos da CPI do Pó Preto.
“Caso os agentes poluidores insistam em não cumprir o que determina a Constituição Federal e as leis ambientais e continuarem a cometer infrações apuradas pela CPI, poderão ser enquadradas nas leis existentes e responderem pelos danos causados”, como garante a comissão, no relatório final de 81 páginas.
Além de Favatto, a CPI é formada por Erick Musso (PP), vice-presidente; Dary Pagung (PRP), relator, e tem como membros efetivos Euclério Sampaio (PDT) e Gilsinho Lopes (PR).Euclério não compareceu à leitura e votação do relatório, sendo convocado o suplente, Almir Vieira (PRP). Assim como Euclério, os demais deputados da Casa se ausentaram da reunião que encerrou os trabalhos da CPI.
Padrões OMS
O relatório recomenda ainda a reformulação do Decreto Estadual nº 3463/2013, que define os padrões para a qualidade do ar em todo o Estado, considerados “no mínimo, tímidos” pela CPI.
Os deputados afirmam que, assim como os limites estabelecidos pelo Conama, os do decreto estão muito acima dos máximos aceitáveis pela Organização Mundial de Saúde (OMS), ideais para que não haja danos à saúde e ao meio ambiente.
“É possível concluir, observando os números e diante do que conclama a população capixaba, que o governo errou, assim como o Conama na década de 90, ao estabelecer limites muito aquém do minimamente aceitável para que fosse assegurada a determinação da Constituição”.
Além disso, diz o documento que o decreto tem vício de inconstitucionalidade formal, já que deveria ter sido objeto de projeto de lei e não de decreto regulamentar.
Desta forma, propõe a CPI que o governo do Estado elabore um projeto de lei e encaminhe à Assembleia para “traçar novas metas mais rígidas e compatíveis com o que espera a população capixaba e regularizando o vácuo normativo ora apontado”. Este projeto, como garante o relatório, deverá adotar os critérios da OMS.
Painéis
Assim como ocorre com as placas indicativas de balneabilidade dispostas nas praias e site das prefeituras, o relatório recomenda ao governo que implante ao longo das principais vias e pontos de concentração de partículas, um sítio eletrônico específico com painéis de controle de qualidade de ar que disponham de informações, em tempo real, sobre as concentrações dos particulados e dos níveis de poluentes existentes na Grande Vitória e em outros pontos sensíveis no Estado. O objetivo é garantir o maior controle, fiscalização e acompanhamento pela população.
Monitoramento
Outra recomendação da CPI é o monitoramento constante da qualidade do ar e do leito marinho nas áreas adjacentes à Vale, ArcelorMittal e Samarco, “o que demonstrará com clareza o nível de degradação ambiental ao longo de mais de três décadas de atuação desses grupos empresariais”.
A medida, segundo o relatório, “demonstrará indubitavelmente a defasagem metodológica e comprovará a falha daquelas empresas e órgãos de fiscalização em relação à falta de indicadores objetivos sobre a qualidade da água, em especial no que tange aos sedimentos depositados nas praias e leitos marinhos”.
Também nesse caso, o relatório convoca a Seama/Iema e os Ministérios Públicos para que investiguem e, se necessário, proponham ações civis públicas para exigir das empresas que “realizem e arquem com os custos inerentes à apuração e monitoramento do leito marinho das áreas do entorno dos seus respectivos empreendimentos, disponibilizando os dados à população em geral”.
Fundo Estadual
Considerando que atualmente o governo do Estado é obrigado a locar recursos públicos que poderiam ser destinados a áreas essenciais para a população, o relatório defende a criação do Fundo Estadual de Controle, Monitoramento e Fiscalização de Impactos Ambientais.
Este deverá ser financiado pelas empresas, que pagarão uma taxa para o “exercício regular do poder de polícia conferido ao Estado para controle e fiscalização das atividades potencialmente geradoras de degradação ao meio ambiente”.
“Nada mais justo que ao invés da população capixaba, que já sofre com os efeitos nocivos dessa poluição, arcar do seu próprio bolso com esse gasto, que sejam as empresas poluidoras as responsáveis pelos ônus”.
Conselhos
A CPI aponta a necessidade a aparelhar o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), os Conselhos Regionais de Meio Ambiente (Conremas), o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) e os Conselhos e Secretarias Municipais de Meio Ambiente. Sem essa integração, o relatório afirma que não é possível promover a plena proteção do meio ambiente.
Assim, caberá à Comissão de Meio Ambiente da Assembleia a elaboração de um projeto de lei para ser encaminhado ao governo do Estado, criando mecanismos efetivos de integração entre os órgãos de meio ambiente. Além disso, para criar o Sistema Estadual de Proteção ao Meio Ambiente e Combate à Poluição (Seprotecom), que terá como um as propostas a revisão da composição do Consema e Conremas, para que conste a participação de um membro indicado pelo legislativo estadual.
Também é proposto ao Consema que, ao propor resoluções, que se baseie em subsídios técnicos e científicos gerados no Núcleo de Estudos da Qualidade do Ar, levando em consideração índices referenciais de controle ambiental e plano de redução da presença da poeira sedimentável no ar da Grande Vitória.
“Recomenda-se ainda ao poder executivo que fiscalize a atuação destes Conselhos, para que não usurpem o papel do poder legislativo no exercício do poder regulamentar”.
Código Ambiental
A CPI ressalta a necessidade de agregar num único corpo jurídico as diversas leis sobre o tema, “facilitando o conhecimento, acesso e propagação de suas normas”.
A elaboração deste Código Ambiental Estadual deve ocorrer numa parceria entre órgãos como a Assembleia e a Defensoria Pública, com o devido debate com a sociedade civil, por meio de audiências públicas.
Fonte: Noticias de Mineração